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Hellblade | Mitologia viking e um forte toque de insanidade

É difícil isso acontecer, mas Hellblade: Senua's Sacrifice é um jogo que assim que bati os olhos, me apaixonei. Logo comecei a ficar com a expectativa alta em cima da coisa, e o medo de me decepcionar era enorme! Felizmente no fim das contas o que tive foi uma experiência única e extremamente intensa envolvendo o universo viking e a condição mental de uma pessoa.




Eu descobri muito por acaso esse jogo, estava vasculhando lançamentos e acabei na página dele, que estava com o status "Em breve", mas me surpreendeu imediatamente o visual. Parecia algo diferente, bonito demais e com uma protagonista dentuça de aspecto esquisito, mas que tinha algo de muito especial.

Fui pesquisar pelo jogo e vi que era da Ninja Theory, o mesmo estúdio que criou Heavenly Sword, Enslaved: Odyssey to the West e DmC: Devil May Cry. Ou seja, um estúdio de jogos AAA, mas por algum motivo eu não tinha visto nenhuma notícia do jogo em lugar algum! Simplesmente pareceu não receber divulgação.

Depois descobri que a empresa tinha decidido fazer algo diferente, ela não procurou uma distribuidora ou apoio, mas resolveu usar a própria grana pra todo o desenvolvimento e aí estava o motivo de eu não ter ouvido falar nem um pouco. Marketing é algo caro, pra você ter uma ideia só o marketing de The Witcher 3 custou mais do que o próprio jogo.

Ou seja, aquele negócio de "Propaganda é a alma do negócio" não é papo furado, é realmente sério e importante, por mais que um jogo seja lindo e maravilhoso, é completamente improvável que ele se venda pelo boca a boca. E no caso de Hellblade a coisa foi bem modesta, tanto que descobri de última hora, próximo ao lançamento.

Graças à falta de apoio também foi um trabalho feito de forma mais compacta, com uma equipe que gira em torno de apenas vinte pessoas. Pra vocês terem uma ideia, os caras tinham tão pouco dinheiro que começaram a usar a moça que editava os vídeos pra capturar movimentos, cobrindo assim o galho, mas com o passar do tempo ela acabou se tornando permanente, dando também voz à personagem.

Achei curioso o fato do jogo sair barato pra caramba, normalmente empresas que tentam fazer algo grande demais com pouco orçamento costumam cobrar um absurdo pra tentar recuperar o tempo, esforço e grana investidos. Sendo assim se esperava o valor de um AAA, com média de R$129,99 , mas foi lançado por R$ 55,99.

Mas bom, antes do lançamento era esquisito entender qual era a do jogo, os vídeos eram simplesmente estranhos demais, pesados. Com toques de horror, mas ao mesmo tempo intrigantes, intensos, notavelmente algo psicológico. O foco eram na narrativa da personagem, tipo em cutscenes, não em gameplay.

Ao pesquisar, vi um cara dizendo que ia ser igual God of War, isso me desanimou de uma forma tão grande, e sabendo que é do estúdio que criou Devil May Cry, parecia coerente a informação. Tem alguns Hack and Slash que eu acho bacana, mas por tudo o que eu tinha visto desse jogo, realmente não era esse tipo de jogabilidade que eu queria ver.

Por outro lado, vi um cara dizendo que seria do gênero souls like, algo que me animou bem mais, e pelo visual e narrativa, também tinha muito a ver. No entanto entre as duas informações, a ideia de um hack and slash parecia bem mais forte graças aos outros jogos da empresa, que são muito movimentados.

A verdade é que não é nem um e nem outro, mas sim um gênero completamente diferente, com misturas de elementos já conhecidos, mas que acabaram criando uma experiência única. Eu tinha lido algo sobre um produtor do jogo ter falado que "ele não é pra qualquer um, mas pode ser pra você!", e realmente acho que isso define muito.

Creio eu que a primeira uma hora de jogo é o que realmente vai definir se a pessoa vai odiar completamente (O que é uma possibilidade firme), se ela não vai ter se prendido, mas vai continuar porque tem esperança, ou se ela vai ficar completamente apaixonada pelo o que é apresentado. Isso porque a principio a narrativa é o foco.

Eu imaginei que seria um jogo mais movimentado, no entanto levou o que? Vinte? Trinta minutos para o primeiro combate? Sendo que os primeiros cinco minutos de jogo são em uma canoa que você deve ir remando enquanto alguém vai narrando algo e você tenta se localizar sobre o que está acontecendo.

Mas mesmo depois que você desce, a narrativa continua, é algo bem lento inicialmente, existem alguns elementos da mecânica que vão sendo apresentados, como fugir da escuridão te perseguindo, porém nesse começo não chega a ser algo que realmente possa causar aquela empolgação, a sensação de ser movimentado.

A história é espetacular! Normalmente quando pensamos em universos do tipo é normal já se imaginar coisas como o agitado War of the Vikings, e claro o mais do que másculo Volgarr the Viking, que a pancadaria rola solta. Vendo essas coisas as vezes é difícil parar pra pensar que Vikings eram mesmo reais e é mais fácil pensar em elementos mitológicos como o Ragnarok, do que em coisas como o fato de existirem vikings homossexuais.

E Hellblade  explora algo bem pés no chão, uma condição mental. Pare pra pensar, pessoas com esquizofrenia, bipolaridade, depressão e etc não surgiram apenas quando o mundo se tornou o que é hoje. É algo que acontece desde o começo dos tempos, então como era alguém que sofria desses problemas naquela época?

Graças à cultura pop, é muito fácil se associar essas condições a personagens muito loucos como em Kane & Lynch, ou capazes de fazer coisas contra a lei, como vemos em Fragmentado ou no clássico Psicose. Mas já parou pra pensar que não é porque a pessoa tem esses problemas que ela vai virar um serial killer? Que na verdade a maioria é vítima e está sofrendo muito porque quer se livrar daquilo?

Em Hellblade é isso que vemos, a protagonista Senua não é uma pessoa má, mas alguém desesperada, que sabe de sua condição, mas a vê como uma maldição. Da mesma forma aqueles ao seu redor também enxergam isso como algo que envolve os deuses. E assim você vaga por um mundo de trevas, enfrentando horrores, levando a cabeça de um homem que amava e tentando recuperar sua alma.

Achei fantásticos os elementos de horror, normalmente jogos medievais tem foco em algo mais mágico e bonito, mas Hellblade se passa em um universo de Dark Fantasy. E apesar da maioria do tempo ter foco na narrativa, tem alguns momentos do jogo que tudo realmente fica como um jogo de terror. É difícil achar obras medievais assim, o único que lembro de cabeça é Snowdrift.

Acredito que se fosse dividir o jogo em gêneros, creio que pelo menos 40% da essência dele é como a que vemos em simuladores de andar, e aliás a atmosfera semelhante à de Dear Esther é simplesmente fenomenal. Até porque boa parte do jogo se passa próximo a uma praia, então você fica ouvindo aquele som do mar, enquanto rola uma narrativa bem intensa e constante à medida em que você chega a certos pontos.

Agora uma coisa simplesmente encantadora demais e que não sei porque diabos ninguém está falando sobre, é em como a simulação das vozes na cabeça da Senua foi feita. Esse é um dos elementos mais bonitos do jogo, intenso, fantástico mesmo! E eu não vi ninguém falar, quero dizer, vocês são surdos? O negócio é equivalente ao pincel de Okami , o tom da voz em Resonance The Lost Score e as palavras mágicas de In Verbis Virtus.

Ou seja, é um elemento único que não vi informação alguma sobre, aliás, inclusive comecei o jogo errado, porque o único lugar que vi algo sobre foi na tela de loading em que aparece discretamente duas informações, uma dizendo que o jogo salva quando aparece um símbolo e a outra dizendo que recomendam usar fone.

RECOMENDAM USAR FONE? É brincadeira viu! Esse jogo tinha que ser obrigatório usar fone, pois a pessoa vai perder uma experiência única que com certeza faz parte da essência da coisa. Hellblade não é meramente um jogo de aventura, é uma experiência com os seus sentidos, que te faz perceber que está sendo guiado pelo lugar.

Você deve estar se perguntando o que tem demais em usar fone de ouvido, bom lembra da holofonia? Aquela técnica que você coloca fones e sente a presença de uma pessoa no lugar? Como se estivesse te rodeando? Pois é, Senua é uma personagem esquizofrênica e tem múltiplas vozes de mulheres que a acompanham durante toda a jornada.

E é aí que a magia começa, pois foi usado um microfone 3D pra gravar as vozes e você pode sentir a distância e localização delas. Essas vozes conversam entre si, conversam com você e também fazem monólogos. Mas o mais importante de tudo, elas são muitas úteis! Não são só vozes aleatórias, com o tempo você passa a ver que são companheiras de viagem.

O jogo faz uma simulação maravilhosa de vozes na sua cabeça, podem rolar coisas como você ouvir atrás de você à esquerda duas delas conversando sobre algo que você acabou de fazer, as vezes você ouve uma falando diretamente no seu ouvido uma ideia sobre como prosseguir. E elas ainda tem personalidades, algumas parecem mais sérias, outras medrosas e outras irônicas.

Por exemplo teve uma vez que eu finalmente consegui abrir passagem por um lugar escuro e enquanto abria elas começaram "Ela conseguiu!" "Sim, agora ela vai poder passar!" "Não, espera, espera, espera, espera! Não entra, você pode morrer!" "Ela tem que entrar..." "Não, se ela entrar, ela vai morrer!", "Ela não vai ter coragem de entrar...", daí eu parei e essa última voz falou "Viu? Ela não consegue! Hahaha!".

As vozes não são meramente gravadas e fixas, elas se adaptam à situação, devem ter gravado uma quantidade enorme de faixas de áudio, pois cada novo lugar, elas mudam pra falar sobre o ambiente e sempre se adaptam à suas atitudes. Chega a ser aconchegante, pois tira aquela sensação de solidão. Diversas vezes desejei que começassem a falar, porém em outras desejei que calassem a boca pra eu me concentrar em algo.

Aliás, como achei uma pena que esse jogo não foi dublado viu, eu realmente queria ouvir essas vozes em português, sei que normalmente jogos do tipo não tem dublagem, mas é só ver que existem algumas obras do tipo, como Everybody's Gone to Rapture, que receberam dublagem e também tem uma narrativa assim. Mas nesse aqui em especial seria maravilhoso!

O jogo vai ficando cada vez mais movimentado à medida que você avança, e é cheio de puzzles, as vezes brincam com o cenário como em Layers of Fear, com modificações cabulosas bem repentinas, e as vezes você tem que usar esse mundo despedaçado a seu favor, viajando entre "realidades" para resolver algo em um mundo e abrir uma porta em outro, algo que alguns jogos como Soul Reaver tem.

Tudo no jogo é diretamente ligado à condição mental dela, se você parar pra perceber. Por exemplo tem as runas, símbolos em portas fechadas que você só vai conseguir abrir se achar esses símbolos e assim você sai pelo cenário achando coisas que formem eles, pode ser uma sombra, um tronco quando olhado de certo ângulo, um reflexo, etc...

Pra alguém que vê isso das runas de jeito rápido pode pensar que é só uma mecânica aleatória do jogo, no entanto se você comparar com pessoas que sofrem dessa condição, vai ver que tem aqueles que procuram símbolos secretos e sinais para algo acontecer. Aliás, a própria Ninja Theory consultou profissionais da área e pessoas que sofrem dessa condição pra fazer o mais próximo possível.

Apesar de inicialmente parecer um simulador de andar, logo jogo começa a se mostrar cheio de mecânicas variadas. Você percebe bem que a desenvolvedora quis brincar com as possibilidades e chega a um ponto em que cada cenário tem regras novas e você precisa entender e se adaptar a elas para continuar, sendo que as vozes te dão ideias.

Tem inclusive alguns momentos que causam desespero, como uma parte em que você precisa ficar perto do fogo, pois tem uma coisa na escuridão te perseguindo. Ou um momento em que é preciso seguir a voz de um personagem, e você está em um breu total, mas podendo ver vultos de coisas se movimentando pelo lugar. A agonia é enorme!

E por fim, sim, existe combate no jogo e sim, de certa forma lembra Dark Souls, não é tão difícil quanto, mas gera um imenso medo de morrer, pois até nisso a equipe criativa resolveu aproveitar para criar o clima de paranoia. Após a primeira morte aparece escrito que se você morrer demais, o savegame será apagado.

Alguns falam que isso não é verdade, mas apenas uma jogada para você se sentir desesperado, mas sendo ou não, consegue criar uma tensão imensa. A coisa piora com o fato de que cada vez mais, uma mancha preta vai crescendo no braço da personagem. Servindo como aviso de que as trevas estão te consumindo.

O combate é muito gostoso por sinal, rolar, defender e atacar, existe aquela sensação de peso. Não é uma personagem super flexível, assim como os inimigos são belos trogloditas. Então quando você defende uma espadada, se não for preciso, a personagem vai toda pra baixo, mas mesmo quando defende perfeitamente o jogo dá aquela parada slowmotion com som de metal, dando uma forte sensação de impacto. 

Uma das habilidades da personagem é o foco, se usado no momento certo, o jogo fica em câmera lenta e há uma liberdade maior para dar sequencias de ataque. Outra coisa incrível do combate é que as vozes te ajudam, é perigoso deixar inimigos te cercarem, mas quando tem um por trás prestes a atacar, as vozes te alertam "Atrás de você Senua!", se você aperta defesa na hora, ela se vira e segura o golpe, é lindo de ver.

A conexão que você sente com a personagem é imensa, ela sofre de uma forma absurda, cai no chão, chora, grita. E tem vezes que a coisa é realmente muito perturbadora, com várias vozes falando com você e o som de algo se aproximando, ambientes escuros, uma câmera tremida. Pra certas pessoas isso deve causar uma grande repulsa.

Enfim, recomendo com certeza, mas sei que não é mesmo um jogo pra todo mundo. O maior problema é que como ele é diferente demais, a pessoa acaba esperando algo e provavelmente não será o que ela espera. Esse é daqueles jogos que você tem que abraçar a narrativa e ir fundo, gostei bastante mesmo, então fica a dica.

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